quinta-feira, 22 de abril de 2010
A morte do meu amor
Encontrei o meu amor, de um jeito de dar dó...
depois de todos os bons carnavais,
ele estava osso só.
Triste e doente, desamparado e ausente de si mesmo.
Vivia abandonado a esmo.
Ninguém sabia onde e nem por que,
ia ou ficava noites inteiras. Se enbebedava.
até quase morrer!
Não o convidei, o arrastei para minha estrada,
No antigo sitio da vovó,
na fonte do Itororó
onde ele ainda ficaria mais só.
Queria vê-lo vivo, aprumado, bem arrumado,
andando feliz ao meu lado.
Mas mesmo magro feito um fiapo,
ele não era nada fraco,
e pensava em escapar...
A cidade dos muitos beijos,
do glamour e dos desejos
não queria mais largar.
nunca mais aguentaria fugir...
teria que se conformar.
comigo ao seu lado,
cuidandodo seu babado,
lhe dando muito minguau!
Já era o fim, bem sentia, sua mão trêmula
nem segurar a minha conseguia.
Encostou seu corpo magro no meu,
e choromingou baixinho:
estou com medo, porque
só na hora da morte você me apareceu...
Esta noite sei que não amanhecerei.
Seus olhos úmidos, indiferentes,
tanto na parede quanto em mim,
vagavam, simplesmente.
Disse-lhe confiantemente:
Não tenha medo, não morrerá
Vai dormir e sonhar,
como se fosse um nino a beira mar.
cantará com as ondas
as canções de um outro lar...
estarei mais perto quando você me chamar.
Ele fechou os olhos
e não os abriu mais toda noite,
assim calado, sem pensamento, sem sonhos.
Fiquei ao seu lado
até que se esfriasse completamente.
Depois o abracei e o coloquei numa cadeira
junto aos raios de sol.
Sua pele branca e fria
nem percebeu o calor!
Me entristeci mas antes,
chorava às cachoeiras pelos vivos,
agora poucas lágrimas
na vida eu cultivo.
Nem toda dor se mede com lágrimas.
Nem todo barco triste navega às claras.
O meu é assim.
Assim foram passando os dias,
ele ficando cada vez mais morto.
Até que não suportava mais o sol,
Levei-o para a horta, fiz-lhe uma cova
entre as plantações e os arvoredos.
Assim pelo menos
o canto dos pássaros ele ouviria,
todo dia, de manhã cedo.
Com todo carinho de minha alma,
ainda abracei os seus pedaços,
pedaços sim, não feitos por mim,
mas porque várias partes dele
já tinha se perdido,
não apenas do corpo,
mas acredito que
quase todo seu espírito,
já tinha se ido.
Mas o amor que eu tinha por ele
ainda estava bem vivo.
Não fui mais para a cidade,
fiquei olhando para ele,
era seu último adeus,
sua matéria fugia apressada
em pequenos riachos
quase como o choro minúsculo
que escorria das minhas faces.
Os dias também choravam,
as águas da chuva cobriam-no
como se fosse um manto sagrado,
de minhas vistas cruelmente o ocultava...
Cada dia, cada sol da manhã,
mais morto ele se tornava.
Fiquei lá numa cadeira sentada.
Não sabia se o havia matado.
Porque longe de mim,
ele sofria mas vivia,
perto de mim
ele parou de sofrer e até de viver.
Era meu tormento...
será que ainda estaria
apenas doente...
reclamando das dores eternamente
Se eu não existisse...
Os dias parecem passar
igualmente para os vivos e os mortos.
Por que sentada ali, ao seu lado, apenas via
um pequeno brilho que restava dos seus ossos.
Quanto tempo não me lembro,
sei apenas que escurecia e amanhecia,
chovia e fazia sol, eu continuava ali.
Meus dentes amoleceram
e cairam por ali, não me importei,
meus cabelos ficaram enormes,
minhas unhas foram além do imaginário.
Sobre a cova dele cresceram flores
raizes e sementes,
beija flores cantam e se alimentam,
na sua ausência, alegremente.
Eu continuei ali até
que me esquecesse de tudo,
olhei o mundo novo,
de risos e de pessoas,
que de tanto me esperarem,
acabaram me encontrando!
Era eu mesma muito mais só, agora,
e se tivessem um retrato meu, diriam:
esta não é você!
Mas vieram de longe
e gastaram o tempo pelo caminho,
assim como suas antigas faces,
também não os reconheceria!
Ninguém me perguntou o que aconteceu...
todos sabem a mesma coisa que sei eu!
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